sexta-feira, outubro 18, 2019

Entre dois nadas...o GIA (Alejandra Muñoz)

No momento em que este texto é escrito, sobre ações que estão acontecendo e que ainda não apresentam uma profundidade de tempo suficiente para um amadurecimento crítico conclusivo, qualquer reflexão que se faça sobre o Grupo de Interferência Ambiental (GIA) é uma tarefa incompleta ou no mínimo parcial. Porém, é uma reflexão necessária diante do ritmo da contemporaneidade, da canibalização midiática de alguns resultados da arte atual e da possível contribuição das intervenções do grupo para a arte baiana. O GIA é formado por estudantes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia e, como grupo acadêmico, é orientado pelo Prof. Roaleno Ribeiro Amâncio Costa. Seu espaço de articulação mais natural é a EBA, mas não é o único. Seu espaço de operação preferido é o espaço público. Seu modus operandi é o acontecimento e a experimentação. Basicamente é um grupo amorfo, sem fundação oficial, sem estatuto, sem local de reunião fixo e sem sequer uma relação das pessoas que participam. Não existe a idéia de filiação nem de qualquer forma de regulamentação. O grupo é quase anárquico, sem líder nem qualquer forma de hierarquia. Fazer parte do GIA é uma atitude, e não uma formalidade: essa é a principal ruptura em relação a outros grupos de estudantes e artistas. As propostas do GIA revelam um entendimento da obra de arte como entidade subjetiva, fragmentária, aberta e instável. Suas intervenções questionam a natureza convencional do objeto artístico, encurtam a distância entre arte e cotidiano, e através do absurdo, re-propõem a vontade dadaísta de aniquilamento dos mecanismos artísticos tradicionais de produção de significados. Utilizando-se da provocação e da ironia, corroem o prestígio social e o valor mercadológico da obra de arte tradicional. No caso de Presente, uma embalagem pequena colocada sobre a abalaustrada do Porto da Barra, a intervenção resgata o gênero do ready-made. Não é o pacote o objeto cotidiano que é escolhido, designado ou ressemantizado como obra de arte, senão o contexto, cenário do pôr-do-sol freqüentemente aplaudido pelos banhistas-espectadores nos fins de tarde de verão e espectacularizado pelos usuários de daquela área. O “presente” vincula de forma ambígua duas idéias: por um lado, a curiosidade do passante diante da possibilidade de haver algo valioso no pacote; por outro lado, a dimensão excepcional da cena pôr-do-sol transformada efetivamente em “presente da natureza”. Em alguns trabalhos do GIA, a exemplo de Cama, a justaposição de objetos descontextualizados lembra o “método paranóico-crítico de sistematização da confusão” de Dali, que servira de base para numerosas associações e inter-relações delirantes em várias obras. O delírio aqui não é ver o objeto “cama” e uma pessoa dormindo na praça, mas sim a indiferença da sociedade diante da cena cotidiana de pessoas que dormem na rua. De modo semelhante opera Pic-nic. A intervenção parte do deslocamento de certos objetos comuns, uma cesta com comida e uma toalha estendida no chão à espera de comensais. O estranhamento provocado nos passantes se confunde com o delírio dos famintos. Não cabe à arte apontar soluções para os problemas sociais , mas sim incitar à reflexão e mostrar as contradições e os valores de uma sociedade. A intervenção no espaço público da praça, cenário de tensões urbanas, cumpre seu papel de revelar uma face do cotidiano que ninguém quer ver mas que todos sabem que existe. No caso de Régua, o objeto aparentemente descontextualizado alude à popularizada relação de proporcionalidade direta entre quantidade (tamanho do pênis) e qualidade (desempenho sexual), que ressalta de modo bem-humorado o mito do macho brasileiro. Poder-se-ia dizer que o GIA resgata o velho conceito clássico de arte como mímese, imitação ou representação da natureza, mas no sentido atual de uma natureza midiatizada e cada vez mais artificial no cenário metropolitano de Salvador e da sociedade capitalista-consumista brasileira do século XXI. O GIA imita aquilo que vê todos os dias. Seu conceito de imitação, condição ambígua, em parte verdadeira e em parte falsa, opera coerente com a cultura heterogênea soteropolitana. Essa é a tônica principal do Projeto Quanto, mediante a linguagem dos cartazes de supermercado popular. Em uma das intervenções no âmbito da rua, a lógica de preços da rede estadounidense MacDonald’s é confrontada com o custo real de um hambúrguer, desmontando o próprio slogan do produto mais famoso da rede. Noutro caso, um banheiro coletivo é veículo para diversos cartazes que, como numa feira, vendem vários objetos cotidianos (de verduras a órgãos sexuais), traduzindo através da relação monetária das mercadorias, a subversão de valores da sociedade atual. Nesse sentido, a intervenção Vende-se, levanta questões parecidas. Um simples cartaz junto à entrada principal, coloca à venda o tradicional casarão da EBA, evidenciando oportunamente os possíveis alcances do inescrupuloso mercado imobiliário diante do sucateamento programado das universidades públicas . os valores riegelianos de memória e da artisticidade do velho casarão (ironicamente em vias de tombamento) são menosprezados pela exacerbação do valor de uso, já aventado por algumas iniciativas institucionais que ponderam exclusivamente o retorno financeiro com um sinal de desenvolvimento. Na intervenção Panfleto, o foco da mercantilização desenfreada desloca-se para o âmbito do desemprego. A promessa de emprego estabelece uma crítica oportuna à situação de Salvador, capital brasileira com o maior índice de desemprego (17 %). Apropriando-se da linguagem do panfleto publicitário popular, convoca-se à participar de um filme pornográfico, situação perfeita mente cabível numa cidade que, extra-oficialmente, tem no turismo sexual uma de suas principais fontes de divisas. Neste sentido, o ativismo político do GIA busca inserção no contexto das dicotomias exacerbadas em escala mundial entre o rolo-compressor do capitalismo ilimitado e as resistências desesperadas de minorias que se opõem ao esmagamento. É o caso do projeto Caramujo, no qual a realidade de habitação improvisada do sem- teto, “efêmero permanente” cada vez mais visível nas cidades brasileiras, se confundem coma a poética dos Parangolés de Oiticica. A estrutura questiona a função primária do abrigo, a ocupação de um lugar, o processo de territorialização e expectativa de um espaço sem imagem ( a fachada representativa), sem forma e sem função ( a planta distributiva de usos e divisões do espaço) pré-estabelecidas. Talvez uma das intervenções mais visivelmente politizadas seja a dos Balões Vermelhos. Em 2003, no mês de ataque dos EUA ao Iraque, vários balões vermelhos foram soltos do topo de u conhecido edifício na Graça. A intervenção nasce de uma referência lúdica: a imagem festiva de balões numa área residencial da cidade. Mas, à medida que as pessoas pegam os balões, lê-se em tiras de papel presas aos balões, questões tais como “ E se fosse arma química?”, “E se fosse uma bomba?” etc. Logo , a intervenção se transforma em protesto ante uma realidade aparentemente distante mas que todos conhecem. A associação imediata com o ato de terrorismo em Salvador evoca o sentimento de vulnerabilidade diante do inesperado, a imagem da tragédia e do sangue do vermelho dos balões traduzidos em glóbulos pelos ares. É essa estratégia surpresiva que opera também no projeto Não-Propaganda. A subversão de veículos de venda de produtos e serviços, tais como faixas de rua ou “homem-sanduíche”, chamam a atenção para o suo desmedido do espaço público e até de pessoas como instrumentos da pressão consumista. Essa intervenções podem ser associadas com alguns trabalhos de crítica ao papel da propaganda e da informação com instrumentos da arrasamento cultural, na linha de questões levantadas por Naomi Klein em seu livro Sem-Logo. Algumas intervenções do GIA, pelo seu caráter efêmero, beiram o niilismo artístico. É o caso da Fila, ação desenvolvida em frente ao quadro de Volpi e na área externa do Museu de Arte Moderna de Salvador. Simplesmente uma fila, retoma algumas questões de Não-Propaganda, mas também provoca a curiosidade do passante familiarizado com a fila como situação cotidiana de espera de algo. A fila, calvário de grande parte da população brasileira, representa a submissão do cidadão para ter acesso aos serviços públicos ( do transporte ao atendimento médico, da matrícula escolar à compra de ingresso para o futebol) ou privados (do banco, do supermercado, do cinema). A “fila desnecessária” é uma apologia da perda de tempo e como intervenção, uma bem humorada reflexão sobre o nosso cotidiano. Sartre disse que o homem atual está no meio de dois nadas: a vida e a morte. Recentemente ouvi de alguém uma lúcida paráfrase dessa reflexão: o artista contemporâneo está entre dois vazios: o espaço público e o da arte atual. O percurso do GIA até aqui é mais uma das tentativas contemporâneas de retomada do espaço público e da arte. Em Salvador, entre dois nadas, as ações do GIA mostram um caminho pertinente de resistência à mesmice e ao tédio.


 Alejandra Hernández Muñoz Arquiteta, Prof.ª de História da Arte Contemporânea, EBA- UFBA. 16 de abril de 2004.

quarta-feira, setembro 27, 2017

Arte para uma Cidade Sensível

No dia 21 de setembro abriu no Museu Mineiro a exposição "Arte para uma Cidade Sensível", com curadoria de Brígida Campbell. Participam 18 artistas e coletivos de diversas partes do país. A exposição pretende mostrar um panorama da arte realizada no espaço público brasileiro nos últimos anos e possui registros de intervenções, instalações e vídeos. O GIA participa da exposição com seu trabalho "Caramujo", um abrigo efêmero amarelo que propõe ao público diferentes usos, a partir dos seus desejos e necessidades.Além de participar da mostra, o GIA - como parte da programação - realizou um bate-papo no dia 22 de setembro no próprio museu, momento em que foi possível falar um pouco da trajetória do grupo, além de pontuar e discutir questões relativas à cidade, aos processos urbanos e à arte colaborativa. A exposição fica em cartaz até novembro de 2017. Mais informações no site: http://www.exa.art.br/arte-para-uma-cidade-sensivel/

domingo, outubro 23, 2016

Ecossistema Tropical 2.0

O projeto Ecossistema Tropical 2.0 parte de uma plataforma de investigação acerca do universo de atuação de coletivos auto-geridos e organizados horizontalmente que ao longo da última década desenvolveram modelos de organização autônomos para a produção de trabalhos na esfera do espaço público. Iniciado em formato de blog no ano de 2006 sob o nome de plataforma DESISLACIONES, gerou ao largo de 10 anos um inventario de práticas e ações que puderam catalisar informações sobre diversos grupos atuantes no cenário urbano e rural da América Latina. Com destaque especial para produção coletiva no contexto brasileiro, os pesquisadores independentes Rosa Apablaza (Chile) e Felipe Brait (Brasil) desenvolveram diversas camadas de estudos e ativações de conteúdos referentes a essa investigação orgânica ao longo dos últimos 10 anos, e que foram circulando por diversas instituições culturais em formatos de palestras, oficinas, conversas, ações e exposições. Contemplado pelo Programa Funarte Rede Nacional de Artes Visuais 12a edição, o atual projeto busca identificar, mapear e produzir uma cartografia coletiva debruçado sobre a trajetória de 9 coletivos nacionais com a realização de encontros abertos em 4 capitais brasileiras. Esses encontros serão realizados em formato de “laboratórios públicos” condensando uma série de atividades gratuitas: apresentações orais e multimídia, trabalhos de mesa, pesquisa de campo e ação urbana ao longo de 4 dias consecutivos em cada cidade. Ao final do projeto será produzida uma cartografia impressa em formato de pôster para ser distribuída gratuitamente em todas as 4 cidades anfitriãs dos encontros: São Paulo-SP, Rio de Janeiro-RJ, Salvador-BA e Belém-PA. A construção dessa cartografia coletiva será guiada por 4 eixos conceituais: narrativas comunitárias, grafismos urbanos, ações nômades e corpo paisagem. Dessa forma, o projeto pretende ser um canal instaurador de estudos de linguagens, modelos organizacionais e poéticas de ação pública, afim de proporcionar uma escultura de dados, mixando diferentes camadas de atuação, metodologias e proposições criticas e estéticas despertadas a partir das trajetórias dessas produções coletivas. ACOMPANHE A PROGRAMAÇÂO PELO SITE: http://www.ecossistema.art.br/

quinta-feira, julho 28, 2016

RIFA-SE



Nome do trabalho : A cama
Autoria: GIA
Ano: 2002
Dimensões: 18 cm  x 27,5 cm



Amigas e amigos, infelizmente um grande amigo está passando um momento muito delicado. Queremos contribuir para amenizar alguma dificuldade que ele tiver. Por isso estamos rifando essa foto registro emoldurada do trabalho do GIA,  "A cama".   A rifa funciona assim, você  deposita o valor em uma das contas abaixo e envia o comprovante no inbox do facebook do GIA:


BRADESCO
AG 0232
Conta Corrente 0096571-5
Cristina Llanos Cruz

Banco do Brasil
AG. 2798-7
Conta Corrente 39815-2
Elena Landinez Cardenas

ou entrega em mãos para alguma dessas pessoas: Mark Dayves, Cristiano Piton, Everton Marco (Dingo), Luis Parras, Ludimila Britto e Tininha Llanos, então você escolhe o nome do peixe e marcamos na cartela. Daí vamos anunciando aqui os peixes que já foram vendidos. O sorteio irá acontecer assim que completarmos a venda de todos os peixes, em local público que iremos anunciar futuramente. É uma causa urgente então pedimos a colaboração de todxs.

PS:Tivemos o cuidado de não informar o nome do amigo para preservá-lo nesse momento tão difícil.
Dúvidas pelo whatsapp 71 993129924






quarta-feira, junho 15, 2016

Feira Tabuão: Foi lindo!!!

De 09 a 12/06 o GIA teve a alegria de participar da Tabuão Feira de Impressos, uma iniciativa da Movimento Contínuo e da Sociedade da Prensa, constituindo-se, segundo seus organizadores,com "uma iniciativa coletiva de artistas e produtores independentes de Salvador". Foram momentos intensos, de encontros, trocas e desejos partilhados, nesse universo gráfico-afetivo de papéis, livros, escritos, poesias........ O GIA montou seu "Auto-atendimento" - uma plataforma de exibição e venda dos trabalhos do grupo, onde o consumidor pode servir-se sem intermediários. Também foram expostos e colocados à venda seus materiais gráficos, caracterizados por uma estética da efemeridade, da precariedade e da aleatoriedade. Veja mais aqui: Tabuão Feira de Impressos... Que venha a segunda edição da Tabuão!! Fotos: Agnes Cajaíba e GIA

terça-feira, abril 05, 2016

Projeto ESPIRAL: Plantar, Pescar e Cozinhar no Coatí

Na Ladeira da Misericórdia, Centro Histórico de Salvador, encontra-se uma construção maravilhosa da arquiteta italiana Lina Bo Bardi, o "Coatí". Lá funcionou durante muito tempo o restaurante Zanzibar, porém, atualmente, o prédio encontra-se completamente abandonado e quase esquecido. O Projeto Ativa, coordenado por Lanussi Pasquali e Joãozito, pretende ocupar o espaço por 2 meses; durante os meses de abril e maio, vários artistas farão uma série de ações/intervenções nos múltiplos espaços do Coatí.......O GIA aceitou o convite e, seguindo o projeto arquitetônico de Lina - que se apropria da forma espiral para a construção do prédio - criou a proposta ESPIRAL, uma série de ações que dialogam conceitualmente com esse complexo arquitetônico. Lina ensina: "Sobre a restauração do centro histórico de Salvador.. pensamos num sistema de recuperação que deixe perfeitamente intacto não somente o exterior, mas também o espírito, a alma interna de cada edifício. " ESPIRAL é uma proposta artística que se divide em 3 momentos: plantar, pescar e cozinhar. No início dessa tríade circular encontra-se o ato de plantar (a construção de uma espiral de ervas na terra do Coatí), como dispositivo deflagrador das ações subsequentes: a pescaria (uma manhã de pesca coletiva no Barco-Escola GIA) seguida de uma cozinha, também colaborativa, no ambiente externo do local. ESPIRAL é um processo artístico que abrange os 4 elementos da natureza em sua amplitude: terra, água, fogo, ar. Iniciamos a primeira etapa (a plantação da espiral de ervas) no último domingo, 03 de abril. Próximo sábado, 09/04, abre a OCUPAÇÃO COATY!! ESPERAMOS TODOS LÁ!!! Mais informações aqui: Projeto Ativa / Ocupação Coaty Fotos: Lu Pires e GIA

quinta-feira, novembro 12, 2015

Exposição Homo Ludens vai até 14/11, ainda dá tempo de visitar!!

NA Galeria do Goethe Institut-ICBA - Av. Sete de Setembro n° 1809, Corredor da Vitória

quarta-feira, novembro 04, 2015

Arte para uma Cidade Sensível

Pessoal, É com muita alegria que convidamos todos vocês para o lançamento do livro "Arte para uma cidade Sensível" nesta próxima quinta-feira, dia 05/11, no Goethe-Institut/ICBA, dentro da exposição Homo Ludens O livro foi patrocinado pela Funarte – Ministério da Cultura, por meio do prêmio “Bolsa de Estímulo a Produção em Artes Visuais – categoria produção crítica – 2014”. Partindo de temas como “Arte entre o público e o privado”, “Tempo e temporalidade na cidade”, “Arte e ativismo político”, o livro reúne reflexões e entrevistas com pesquisadores do campo da arte e do urbanismo, além de trazer um coleção de diversos artistas que desenvolvem seus trabalhos nos espaços públicos brasileiros. Editada em parceria com a editora Invisíveis Produções, de São Paulo, em versão bilíngue (português-inglês), a publicação terá uma tiragem de 1000 exemplares e distribuição gratuita.

sexta-feira, outubro 02, 2015

Cozinha GIA+PORO

Cozinhar é um ato revolucionário!!! Maravilhoso risoto do sertão feito pelo PORO na exposição do GIA na galeria Luiz Fernando Landeiro Arte Contemporânea, 01 de outubro de 2015.